Ela estava tímida e meio encolhida, parecendo ainda menor,
em um canto do quarto de costas para ele. Tentava, em vão, esconder uns
ursinhos antigos e velhos. Ele poderia apostar que cheiravam como ela. A visão
fazia-o rir, encostado no batente da porta olhando-a atentamente, seguia com os
olhos os movimentos cuidadosos e apressados que ela tinha com os ursos.
Acostumara-se com ela despreocupada sorrindo e falando mais e mais rápido que
uma pessoa normal conseguiria.
Vê-la encolhendo-se e acanhada era realmente diferente. Ele
quase não podia acreditar que ela era capaz de sentir vergonha ou ficar
encabulada. Ele sorriu e pensou: “Afinal de contas, ela é uma garota como
qualquer outra, e é possível sim envergonhá-la” e no segundo seguinte
condenou-se pelo pensamento. “Ela não é como qualquer outra”.
Afastou-se do batente e a passos lentos. Aproximou-se dela
sem fazer barulho, mas não foi o bastante, como se sentisse a presença dele
virou-se para encará-lo. O sorriso encabulado ainda estava lá, mas os olhos
estranhamente claros emitiam uma luz mais calma, como se a presença dele a
acalmasse. Ele riu alto e a puxou para perto, ela deixou-se levar e bateu de
encontro ao peito dele no mesmo momento em que ele a segurava protetoramente.
Ele abaixou a cabeça e beijou o topo da dela. Ela era
pequena, mal batia na metade de seu peito, e no meio de seus braços, ela
parecia ainda menor. Olhando para cima com os olhos grandes e sinceros ela sorriu,
como se pedisse desculpa. Seus lábios começaram a formar uma desculpa pelo
quarto cheio de brinquedos quando ele colocou os dedos sob sua boca e a impediu
de falar.
“Não importa, eu gosto, faz parte de você”.
Ela suspirou aliviada, mas ainda assim não parecia completamente
relaxada. Ele sentou-se na cama e puxou-a para junto de si, gostava dela assim,
no meio de seus braços. Ela enroscou-se nele como apenas ela era capaz de
fazer, quase como se enlaçasse os dois em um nó justo. Ele riu e acariciou os
cabelos dela enquanto distribuía os beijos por seu rosto levemente rosado pela
timidez.
Ele ria-se e divertia-se cada vez que ela corava ou se
contraía de vergonha, adorava saber o modo como a afetava, assim como adorava o
modo como ela o afetava. Às vezes ele achava que ela não tinha a menor ideia de
como o provocava, mas então ela vinha com uma daqueles pequenos sorrisos que
apenas era capaz de sorrir. Um sorriso metade mulher, metade menina.
Mais a vontade, relaxada e acalmada pelos carinhos, ela
começou a soltar-se e retribuir os carinhos, os beijos. Ele sorriu e aperou a
cintura dela, e foi retribuído com um beijo na orelha dele. Finalmente relaxada
e em seu estado natural, ela jogou a cabeça para traz e riu enquanto ele
beijava seu rosto. Brincavam de rato e gato, sem querer fugir um do outro, sem
querer se afastar, sem querer ficar longe.
“É tão bom aqui” ela sussurrou suavemente, passando as mãos
pelos cabelos dele, cantarolando uma música antiga. O timbre da voz dela era
calmo e tranquilo. Era familiar, como algo frequente, algo que ele conhecesse a
vida toda. Era natural apoiar a cabeça no ombro dela e se deixar acariciar por
ela, com os carinhos cuidadosos e delicados.
“Me fala de você” ela pediu delicada, continuando a
cantarolar e passar as mãos pelos cabelos dele.
“O que você quer saber? Pode me perguntar qualquer coisa,
falar com você é tão fácil que eu sinto que te contaria qualquer coisa”.
“Me conta da sua infância, do seu irmão, do seu sorvete
favorito, o que você gosta de fazer... não sei... Me conta tudo, eu quero saber
tudo”
Ele riu e a apertou de encontro a si, não tinha muito que
contar além de tudo o que ele já havia dito. Ele mal acreditava que havia
contado sobre toda sua vida pra ela, e em tão pouco tempo. Uma semana não é
tempo, mas ainda sim, entre eles havia sido. Perdido em pensamentos, não notou
quando ela se desenroscou dele, levantou-se e o puxou para fora.
Ela deitou-se na grama, os cabelos espalhados, as roupas desarrumadas
e amarrotadas. Ela não disse nada, não se mexeu, simplesmente olhou-o
convidativamente, ele riu e não esperou uma segunda indicação. Deitou-se ao
lado dela no quintal, o sol sumia no horizonte, e a lua aparecia timidamente no
céu que começava a escurecer e revelar as estrelas escondidas pela luz do dia.
Como em um sonho que se desfaz com a manhã, ela ficava
pálida e quase translúcida ao brilho da lua e das estrelas que agora brilhavam
absolutas no céu. Uma noite clara de lua cheia, ela sorria e brilhava,
transparecia felicidade. Não era compreensível e não tinha que ser, era algo
deles e entre eles que só precisava ser sentido. Pensar era obsoleto, sentir
era natural e agir era apenas uma consequência automática.
Seus lábios tocaram os dela, leve, suaves, e com uma brisa
suave, uma garoa fina e uma música sussurrante ela foi-se. Quase não saberia
dizer se era sonho ou realidade, se era verdade ou mentira. Ela sumia pelo
tempo que tinha que sumir, e voltava quando era hora de voltar. Nunca ficava mais
tempo que o necessário, mas também nunca partia antes de precisar. Ele não
tentava segura-la, não tentava detê-la, aceitava o tempo que tinham, sem pensar
no futuro, apenas ansiando pelo depois.